o menu do dia era ambicioso. conhecer o parque natural de montesinho, visitar umas quantas aldeias, fazer uma bucha em gimonde, e se tivéssemos tempo, acabar o passeio em bragança. isto tudo até por volta das seis, para não chegarmos muito tarde ao destino do dia, caçarelhos, que fica já em pleno planalto mirandês.
(porque infelizmente ainda não dominamos o conceito de deitar cedo e cedo erguer) deixámos tuizelo por volta do meio dia. agora sim, a aventura ia finalmente começar \m/
com neve nos picos da sanábria e vento a soprar de norte, o parque de montesinho parecia um frigorífico. mas o cenário compensa o desconforto.
então, a isa tem uma *certa* obsessão com fronteiras. aquela linha muitas vezes imaginária fascina-a de sobremaneira, mas não sabe bem explicar o porquê. e como é lógico, estando tão perto, não ia perder a oportunidade de andar a roçar-se nelas.
por exemplo este troço de estrada, que segue os contornos da nação:
não existe aqui nada, não tem nenhuma atracção especial. a paisagem é bonita mas nada do outro mundo. no entanto perdemos aqui mais tempo do que aquele que quero admitir, aos saltos entre os dois lados. portugal.. espanha.. portugal.. espanha.. portugal.. espanha.. muhahahah adorei!
uns kms mais a frente, um cenário muito caricato ao dobrar uma curva: um cemitério na localização mais estratégica de sempre (com o devido respeito aos que lá repousam). que é como quem diz, uma distracção na estrada e vais directo à tua última morada!
a próxima paragem seria a barragem da serra serrada, no topo do parque. para alcançá-la passamos por uma aldeia com um nome brutal, cova da lua, e que eu me arrependo muito de não ter parado para conhecer melhor. aqui vi a umas casinhas que me despertaram a curiosidade. semi-redondas, baixinhas, com o telhado de esguelha, e sem janelas, apenas uma pequena porta. mas tinha pela frente demasiados km para estar a fazer paragens não programadas e não quis arriscar..
seguiu-se uma etapa em modo off-road. se há uns anos não me chateava mesmo nada enfiar o carro em estradas de terra batida, agora, com o carro a fazer oito anos e já com mais de 150k km no motor, começo a ficar com medo de grandes cavalgadas - algo que me rende gozos da parte do homem, que antes era badass e agora estou feita uma coninhas e assim. anos.. anos de dedicação!
funny thing. ia visitar uma barragem, acabei por visitar duas. é que a primeira que encontrámos, a barragem de veiguinhas, é recente e nem sequer aparece no google maps.
e que belas vistas, tanto uma como outra, renderam!
apanhamos vários estrangeiros a caminhar por estas terras. fiquei invejosa.
próxima paragem: aldeia do montesinho. esta é clássica. ir ao montesinho e não ir à aldeia do montesinho era como ir a roma e.. you get the picture. esta aldeia é um postal. está bem preservada, as habitações em xisto ou granito, têm sido reconstruídas respeitando a traça tradicional. foi aqui onde pude ver pela primeira vez as casas típicas transmontanas que, segundo o que aprendi na escola primária, têm dois pisos. no de cima é onde vivem as pessoas, no de baixo é onde guardam o gado, para ajudar a aquecer a casa. ou qualquer coisa nessas linhas, já foi há muito tempo que andei na primária. quase 30 anos *gulp*
entretanto passámos por uma série de aldeias, mas não houve oportunidade de parar porque já se fazia tarde e eu ainda não tinha chegado aquela que mais queria conhecer, rio de onor.
quando andei a lamber o mapa, tropecei numa aldeia no extremo nordeste transmontano que parecia ser atravessada pela fronteira. eh lá! eu tinha que ir ver aquilo com os meus próprios olhos e especialmente, ouvir os habitantes. que língua se falaria ali? português? espanhol? portunhol?
são duas aldeias diferentes, rio de onor e rihonor de castilla, e independente de pertencerem a países diferentes, a população não liga muito à divisão e vive em comunidade, partilhando entre si, recursos naturais e infraestruturas. a parte portuguesa está mais habitada, e está (muito) melhor preservada que a gémea espanhola, que está a cair aos bocados. em relação a línguas, no lado espanhol ouvimos falar espanhol, no português, português. de riodonorês nem um pio :(
entretanto encontrei um post que explica muito bem a divisão entre as duas aldeias.
tinha dado dois paços em espanha, quando vi este painel informativo sobre a zona:
decidi trollar o homem:
"olha lá mor, estamos na serra de la culebra"
wait for it... wait for it.. waaiiii...
"enrique, estas aqui?" ... "e tu? siempre como culebra!" quando começa com isto não consegue parar tão cedo muhahahah não se calou na meia-hora seguinte, pelas ruas derihonor, a dizer que ia bater à porta e perguntar se o enrique estava. tão bom (para quem não apanhou a referência, fica o link)!
aquilo que mais me belisca, é que nestas aldeias, apesar o lufa-lufa dos seus habitantes, vive-se muito devagar. parece que o tempo é infinito. e o contacto com a natureza é qualquer coisa.. uma corsa saltou do meio do nada para o meio da estrada e desapareceu novamente para o meio do nada. fiquei maravilhada. só faltou ver um lobo.
dali seguimos por guadramil, uma aldeia do mesmo género de rio de onor, mas ainda mais isolada, como se tal coisa fosse possível. arrepio-me de pensar em como será viver num sítio tão remoto. ok, bragança não fica assim tão longe como tudo isso.. mas é uma zona muito desolada.
chegamos a gimonde demasiado tarde para almoçar e demasiado cedo para jantar no abel, mas como estávamos a morrer de fome acabámos por ir petiscar uns enchidos numa tasca ao lado. e porque fomos descaradamente cobrados à turista estrangeiro, não ganharam novos clientes.
ainda raspámos em bragança mas como já se estava a fazer tarde e ainda tínhamos uma hora de caminho até caçarelhos, acabamos por não parar. três assuntos inacabados, posta n’o abel, e visitar cova da lua e bragança. quatro, se juntarmos uma caminhada pelo percurso do porto furado.
estava eu a comentar com o homem, enquanto esperávamos pela nossa anfitriã, que pelo valor da dormida daquela noite, caçarelhos ia ser o elo mais fraco das pernoitas. mas depois a dona do alojamento chegou, abriu a porta e disse que a pequena, mas muito acolhedora casa, já com a lareira acesa e tudo, estava por nossa conta.
oi?
não deu para perceber bem quando fizemos a reserva no booking, mas aparentemente, não era um quarto, era a casa toda! quarto, sala, e cozinha, abastecida com pão fresco, ovos, leite, iogurtes, queijo, fiambre, sumo, doces café, chocolate, chá e toda a panóplia necessária para cozinhar... por 40€? sabem aquela sensação que estamos a roubar alguém sem estarmos a roubar? foi por ai.. acabámos por pagar um bocadinho mais do que o suposto porque a consciência não deixava. uma pena do caraças só ficarmos lá uma noite.
also, a dona da casa emprestou-me um guia da rota da terra fria que me veio complicar o esquema.. passei o resto da noite a marcar estrelas no mapa, de sítios que seria interessante conhecer. oh my...
* estadia patrocínada pela minha estimada conta bancária
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